sexta-feira, 31 de julho de 2009

O filho, a viúva e a neta

O Filho
Durante três meses ele dormiu todas as noites agarrado a mão do querido enfermo. O ambiente cheirava a remédios e doenças, as pessoas fantasiadas de branco cuidavam e descuidavam de uma saúde valente, porém solitária numa guerra de microcombatentes. Nos seus olhos se via a tristeza caminhando ao lado da esperança, esta por sua vez rezando pra Santa Vida acudir as preces dos mesmos olhos. Os médicos calcularam os últimos minutos. A terrível espera pelo último suspiro e o cheiro da morte desencadearam uma série de lágrimas e desespero:a última respiração.


A Viúva
Muitos anos a dois se tornam uma unidade. Já sabia da fatalidade, mas nunca se quer acreditar. Não havia cena mais triste que vê-la debruçada no caixão aos prantos gritando pelo seu velhinho, gemendo palavras de consolo que não consolam, esperando abrir os olhos e acordar de um pesadelo ou atirar sua vida na janela e deitar-se ali esperando que seus filhos não sofressem. Questionar Deus parecia tão pertinente, por mais que a fé fosse a única medicina a se recorrer.Impossível não sentir dor, impossível não vermelhar o rosto e sentir queimar as lágrimas entre as rugas, manifestações de um amor.Impossível.

A Neta
Vê-lo doente de cama já foi um choque. Homem respeitado e viril. De honra ilibada e notória, sempre forte. E agora, fraco me olhando com suplício, olhar esse que eu nunca mais vou esquecer. E agora...ver minha querida avó sofrer nos meus braços e eu a beijar suas lágrimas tremula de dor. Dor essa que eu nunca senti, dor essa que vai apunhalando o peito e o estomago como se corroesse o coração, como se toda a maldade me atormentasse, dor que não cabia em mim. Pior é ver que essa dor era como se fosse epidemia, todo mundo em prantos. Um cenário mórbido e torturante. Só de pensar que a terra iria cobrir o seu rosto negro, só de pensar que os dias dos pais seriam flores no sepulcro ao invés de camisas e meias, só de pensar que o almoço no domingo teria uma cadeira vazia. A procissão de pessoas em rezas e uma família unida pela dor, resta-nos a consolação de poder viver na lembrança das coisas boas.




Na saúde e na doença, na alegria e na tristeza...
Querido avô, descanse em paz.

4 comentários:

  1. Comecei a escrever aos quinze, quando minha vó veio a falecer. Há um momento em que passamos a entender esse grato caminho da poesia, que é quando as palavras começam a deslizar melhor a dor.

    Volte sempre! Passarei por aqui também. Um beijo!

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  2. Ah, o que dizer? Você retratou bem tudo aquilo que havia me falado. Pensei em lhe dizer para escrever sobre isso, para ajudá-la, mas confesso que fiquei meio sem jeito. Pedir para expor a nossa dor é algo complicado... Mas você fez isso de uma maneira muito sóbria. Parabéns!

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  3. Presto aqui minhas condolências e qualquer outra palavra seria desnecessária.

    ...

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  4. Na
    Não chame a isso de dor
    Chame de amor

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Deixe sua alegria após o sinal, biiiiiiiip!