terça-feira, 2 de junho de 2009

Linha Azul

E de repente eu vi o moço parado em frente a porta magnética, esperando que ela abrisse para entrar no trem. Foi um passo com o pé esquerdo, os olhos procurando um assento disponível e os meus olhos procurando uma atenção nos seus. Todo de branco, como se fosse o médico que iria curar a minha doença, acho que foi isso que eu vi naquela hora, uma cura. Mas não é plausível atribuir ao branco a cura das doenças da cabeça. Não se sentou, não havia mais lugares, de modo que eu o via, descaradamente, pelo reflexo da janela. Ele nem se sentiu incomodado por estar sendo vigiado, talvez nem sabia. Dizem que os anjos não ligam pra vaidades.

A mulher do meu lado, bem percebeu a presença do jovem e nem se deu o trabalho de olhar pela janela. Ela tinha os cabelos brancos e engomados, como se fosse dia de festa. Na sua mão um lenço cor amarelo cobre com missangas azuis e vermelhas. O sapato de dança de salão, mas se via que nunca tinha dançado na vida. Os olhos juvenis se deliciavam com o mero deleite, a sensação de vida com a paquera, era mais um sono gostoso de juventude anonimada.

O homem que me olhava - e eu só fui perceber depois - sacava meus pensamentos, mas eu sacava mais os dele. Ele estava triste e desolado com a mulher, sabia que ela não gostava mais dele e estava procurando uma outra distração. Mas ele sabia o motivo, trabalhava demais e com o passar do tempo não sabia mais voltar pra casa e sentir-se a vontade. Olhava pra mim como se eu pudesse sair correndo com ele e mudar de vida, via em mim a esperança de uma vida toda pela frente, mas mal sabe ele que...

O menino que entrou de mãos dadas com a mãe estava muito feliz por estar ali. Não tinha espaço pra sentarem e por isso ficou brincando de surfar com o andar do trem, olhava pra mãe como quem diz "olha mãe, eu consigo ficar sem as mãos!" e quase cai quando o trem parou bruscamente. A mãe olhou dizendo: "Tah veno, eu falei pro cê segurá, vai caí menino". Ele riu porque não tinha caído. eu quase fui brincar com ele, mas já não teria a mesma graça.


"- Estação Paraíso." O maquinista gritou. Todos desceram, até o homem que me olhava, até o moço de branco. Os outros figurantes iam descer na Luz ou na Saúde, eu não sei. E eu fiquei sentada esperando a Santa Cruz chegar.

4 comentários:

  1. Já pensou em lançar um livro de crônicas...? Você escreve do mesmo jeito que eu autor que eu adoro escreve...você leu Fernando Sabino? Acho que você aprendeu com ele!!!
    Dê uma olhada nesse blog, é um amigo meu que escreve, ele é poeta e ator:
    http://floradelugar.blogspot.com/2009/06/fragmentos-retalhos.html

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  2. "... mas mal sabe ele que..."? O quê? Confesso, eu fiquei curioso.

    Sabe, eu me vi andando de metrô novamente. Eu sempre descia na São Joaquim, achava a Liberdade exótica, pensava na Paraíso como o prelúdio de algo bom, mas ao final todos procuravam a Estação Esperança.

    Adorei a crônica. Parabéns, Nana!

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  3. Este comentário foi removido pelo autor.

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  4. A arte que faz P.arte(com a permissão do trocadilho), de observar e ser observado no metrô! =D

    PS: eu só havia esquecido uma palavra no comentário anterior, para os curiosos de plantão. ^^

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